sábado, outubro 18

Paraíso

Ele acordou antes do relógio despertá-lo. Abriu os olhos e espreguiçou-se daquela maneira gostosa. Lançou os olhos em direção à cortina de algodão cru que balançava ao ritmo da brisa do mar.

Calçou aqueles velhos chinelos, pegou aquela velha xícara e requentou aquele velho café de ontem. Bocejou, esfregou os olhos, e foi ao banheiro. Sentou-se, e fechou os olhos, naquele momento de alívio e preguiça. Lavou as mãos, e foi a varanda ver o mar. O céu, daquele mesmo tom de cinza clareado, apresentava-se estranho.

Ele voltou para dentro de sua casa, e colocou aquela música de dias como aqueles: dias preguiçosos. Colocou o café na xícara e o bebericou sentado no sofá pequeno e confortável de sua pequena e confortável sala. Fechou os olhos novamente, e aspirou aquele cheiro inconfundível de café ao som da música. Riu do dia anterior. Riu do amor que foi embora ontem, e que voltaria hoje. E se pegou lembrando da noite passada.

Lavou a xícara. Comeu uns biscoitos. E arrumou um livro desalinhado da estante. Tomou o banho quente, na luz cinza e triste do dia. Lavou-se, e a preguiça escorrera pelo ralo. Voltou ao quarto, vestiu-se, desligou o rádio, e desceu para o quintal, onde o carro o esperava para mais um dia, deixando a cama desarrumada e a toalha molhada em algum canto.

Deu partida. E foi. Andou naquela estrada da encosta em direção àquela pequena cidade onde trabalhava. Lá embaixo, as ondas batiam na escarpada. A espuma soltava o cheiro de mar. E o aroma impregnou no carro. Afastou-se da costa, e cruzou os campos de trigo, onde as velhas olharam-no com aquele sorriso de velhice. Retribuiu com o aceno jovial de sempre.

Chegou. Trabalhou. Tomou decisões. Escolheu. Conversou. Almoçou. Trabalhou. Tomou mais decisões. Escreveu. Riu do e-mail. Respondeu com amor. E lembrou de novo da noite anterior. Um dos únicos raios de sol passou pela vidro polido da branca janela de seu escritório. E pensou na sorte que tinha em estar ali. Em viver com o amor de sua vida. Em viver na casa que sempre sonhara ter. No emprego que sempre quisera ter. E na vida que levava.

Ligou. Marcou no petit caffé do Centro. E ao chegar, seu coração bateu mais forte. Instintivamente, olhou para o espelho. Ajeitou o cabelo, e sorriu em direção a. Sentou confortavelmente.

- "Os pães daqui são ótimos!" - disse.
- "Você acha que marcamos aqui por pura coicidência?".

Ele riu baixinho. Colocou sua mão na mesa. A outra entrelaçou-se a sua. E as alianças faíscaram a mais um raio de sol que iluminara o dia dele. O céu continuava naquele cinza de antes, mas parecia mais feliz. As cores pareciam mais vivas. Tudo era mais real e puro quando estava com o seu amor.

Comeram aqueles ótimos pães. E tomaram um café forte. Ao longe, bem ao horizonte, nuvens anunciavam a garoa. Saíram, e foram na pequena mercearia. Seus olhos registravam preços, e sua mente fazia contas. Comparava. Pensava. E seu amor era alheio. Primava pelo melhor, e sempre o escolhia. Discutiram de forma doce. Riram e chegaram num concenso.

Pensando no que iria cozinhar, ele começou a colocar tudo o que precisava. Macarrão. Tomates. Cebolas. Alho. Temperos. Manjericão. Cenoura. Berinjela. Maçãs. E tudo o que precisaria para a semana.

Compraram e foram para a casa. Cozinharam. Comeram. Conversaram. Riram. Ele leu. Seu amor assistia. Conversaram mais um pouco. Colocaram música. Dançaram. Riram. Caíram no chão coberto pela noite nublada e chuvosa. Fizeram planos de sair dali. Mas ali, tudo era tão perfeito, que logo abandonaram a idéia. Fizeram mais planos. Filhos. Mais alguém além dos dois. Seria tão bom...

Pensaram em nomes. Em móveis. Em espaço. E pensaram em mudar dali. Mas ali, tudo era tão perfeito...

Se amaram, como se fossem únicos, e eram, de fato. Conheciam os corpos um do outro como ninguém. Tudo era tão prazeroso. Tão único. Tão intenso e leve. E dormiram com o cheiro de grama molhada, que invadia o quarto através das frestas da janela de madeira. Ele levantou-se da cama e olhou seu Amor dormindo. Naquele momento de paz, olhou para o céu chuvoso, e numa prece rápida e silenciosa, agradeceu por tudo aquilo.

Esquentou a água, bebeu seu chá. E olhou o relógio na luz noturna da lua minguante que banhava a cozinha. O reflexo das gotas escorria pela parede e pelo relógio.

- "Preciso ir dormir" - dissera ele, baixinho.
- "Então vamos voltar para a cama" - respondeu o seu Amor.

Ele riu de espanto e prazer. E cedeu-se mais uma vez ao prazer pleno de estar com a pessoa que mais amava nessa sua vida. E adormeceu com aquele sorriso nos lábios.

Acordou com o cheiro característico do café preparado pelo seu Amor. Era diferente do seu café. Era mais forte. Ele levantou e ajudou com o café, beijando como sinal de presença. Sorriram com o simples fato de estarem um na presença do outro.

E assim começava um domingo chuvoso no meu paraíso...

6 comentários:

Pavinatto disse...

Darling, o único Paraíso que eu tenho ultimamente é a estação de metrô com esse nome. Rs.

Prince of Angels disse...

adorei!!! acho que foi um sonho bem legal!
rs

Eric Goldrim: disse...

Perfeito. Adorei seu blog.

Abraços,

Eric.

Eric Goldrim: disse...

Perfeito. Adorei seu blog.

Meu paraíso está extreamente chuvoso...

Abraços,

Eric.

Anônimo disse...

Nossa....
Adorei, vou chama-lo de poema, Me remeteu àos meus desejos. foi como se eu estivesse ali, sentindo tudo que você escreveu.
Na minha mente é um sonho e nada mais, mas no meu intimo é um dos meus maiores desejos e vontade.
A simples e pura felicidade.

Just me disse...

Embora seja um post antigo, como só tive acesso a ele hoje, acho importante deixar um recado. Você escreve incrivelmente bem e é legal ler algo tão sincero e cheio de sentimento. Espero que alcance esse sonho e que ele seja ainda melhor. Abraço!