terça-feira, dezembro 21

Ser só é só ser aquilo que tem que ser por um momento

Saio do cinema.
As palavras saem da minha boca, numa conversa séria, com uma garota não tão séria assim.
Mas o papo é sério.

O papo é amor.
E o amor, para mim, sempre foi papo sério.
Encontrar o cara certo sempre foi sério para mim.
Relacionar-se. Namorar. Assuntos sérios.

E esse papo sério veio de um filme que acabávamos de assistir.
"Do começo ao Fim".
A estória de dois irmãos, que depois tornam-se amantes incondicionais.
O ideal de uma relação gay.

Antes de começar a falar daquilo que senti depois desse filme, quero fazer uma pausa em homenagem ao que acabei de escrever.

É a primeira vez que escrevo aqui, abertamente, sem amarras, sobre o meu desejo afetivo e sexual. É a primeira vez, aqui no meu empoeirado "Infinito", que digo que sou gay. Espero que você, leitor, não me encare de forma diferente. O fato de me sentir atraído por homens não modula meu caráter, minha personalidade ou meu valor. Sempre fui assim. E continuarei sendo. Assim como você também foi, e sempre será hetero, bi ou homossexual.

Aplausos.

Voltemos ao papo sério.
Depois de ver dois atores (que poderiam ser facilmente modelos), interpretando dois meio-irmãos completamente apaixonados e dedicados um ao outro, um certo dissabor surgiu.
No filme, tudo era tão utópico (viviam em uma casa sensacional, com corpos sensacionais, sem problemas referentes a carreira, estudo, auto-aceitação, vida social e etc) que era quase inacreditável.
Como dizem, "coisa de cinema".

Mas tirando a utopia, o que mais me marcou, e o que eu acredito ser possível, é o amor incondicional. O cuidar sempre. O amar sempre. É o respeito, o carinho, a preocupação, o bem estar que um desfrutava do outro. Isso sim pode ser real.

E eu saí do cinema oco. Desesperançoso. Olhando para trás, para as minhas experiências amorosas nem sempre bem sucedidas, e me perguntando, apesar da tenra idade, "O que é que eu construí para isso?".

Fiz essa pergunta à minha amiga não tão séria. E ela me respondeu algo.
Não há o que fazer, Luiz - disse ela - A única coisa que você pode fazer é esperar.

Quem já leu algumas coisas aqui, sabe que eu não sou de esperar por nada.
Acho que já deu pra ter uma idéia que eu sou o tipo de pessoa que pega a Vida pelas unhas, e monta nela, põe as rédeas, e sai galopando por aí, fazendo a minha estrada.

Mas quando se trata de amor, de relacionamentos, esse cavalo (que parece um leão, de vez em quando) não é capaz de fazer nada, exceto relinchar e bater os cascos no chão, impotente.

Quando é que vou provar desse prazer tão gostoso (e sei que é gostoso, porque sinto que já provei disso, não como Luiz, mas como Espírito)? Quando é que o cara que me fará feliz irá cruzar a minha estrada, e galopar junto comigo?

São coisas que não são previsíveis. O que eu posso fazer, e é o que eu sempre faço, é continuar. Continuar a construir uma carreira sólida, um conhecimento sólido. Sem pestanejar, sem lamentos ou decepções. Ser sozinho também faz parte da nossa Evolução.

E não estamos aqui, nessa Terra, a compras ou a passeio. Estamos a evoluir. E ponho na mão do meu Destino a melhor maneira de evoluir.

Quer seja montando no Leão só, quer seja com o meu cowboy ao lado.

terça-feira, novembro 16

Efeito Lispector

Do hiato branco, da folha paltada, do prompter que pisca, eu surjo.
Como de um chão de podres, de um chão seco, sem água, sem vida, quase que por um milagre, eu surjo.
O milagre do pensamento, esse milagre que chamam de Deus, faz brotar, do inorgânico e do orgânico falido, o botão.
O botão surgiu de uma haste verde, dentre os verdes mais descarados e díspares.
Botão esse que se rompe, e deixa entrar dentro de si, o vácuo do qual é rodeado.
Ao mesmo tempo que entra o vácuo, sai a vida.
A vida de quem escreve.
A vida de escritor é estar a mercê de seu próprio cataclisma e resurreição.
É estar sempre inseguro sobre quantas marés e secas o seu caderno sofrerá.
A sua vida sofrerá.
Porque estar a mercê de si, na insegurança de si mesmo, é algo pavoroso e, de tão inconstante, nos faz beirar à loucura.
A lacuna que é preenchida pela vida é tão mal preenchida pela incerteza que, de certo, me faz parar e pensar: "Por que sou o que sou?".
Não sei - respondo a mim mesmo.
Não sei, eu repito.
Ressurgir e reinterar-se é algo tão doloroso, que, de tanta dor, é necessária tanta morfina, que acabo entrando em letargia, sem nem saber o quão doloroso é.
Mas sei que é.
Sei que dói.
Sei porque dessa dor e desse pavor já provei.
Das madrugadas sem sono, rodeado de minha própria sombra de filósofo, corre o fel. Corre o fel, que por instante e por uma careta, engulo sem questionar.
Engulo na esperança de poder passar esse mal que é ser o que sou.
Burro eu, não?
Engulo um antídoto produzido por mim mesmo, na esperança de curar a mim mesmo.
Redundante... Eu sei.
Mas é o risco que eu corro quando tudo se aquieta, e a minha alma parece imensa demais, larga demais, feia demais.
E nesse pavor de encarar a si mesmo, acabo recorrendo ao meu maior desabor: provar do meu próprio veneno.
E eis que sigo, cabisbaixo, imerso no estupor de mim, de lápis e folha branca como giz na mão, rabiscando os próprios pensamentos.
A minha própria filosofia.
A minha própria vida.